Por Adriana Dias

Com o tema “Descriminalização das Drogas e seus Impactos no Sistema Prisional e Judiciário”, foi promovida, durante esta terça-feira (21), a 1ª Audiência Pública sobre Política de Drogas e Encarceramento. A advogada Ana Fábia Martins, Vice-Presidente Jurídica da Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis (ABICANN), participou do encontro e utilizou o tempo de fala para denunciar e expor o caso da família Lerário.

“Somos contra a PEC das Drogas, por entendermos que casos como da Dona Cleuza Lerário e de seu marido, que perderam o filho Samuel, por erros da mesma Justiça que, um dia, já deu esperança de vida para o menino recem falecido. Após a perda do Habeas Corpus para cultivar o remédio com Cannabis, a polícia de Minas Gerais invadiu a residência e levou as plantas. Essse é um dos milhares de exemplos que nos faz refletir sobre os riscos de colocarmos na cadeia cidadãos que precisavam ser protegidos pelo Estado e são punidos, sem a correta análise. Enquanto isso, traficantes ficam fora da cadeia.”

“Perdi meu filho para a ignorância e para interesses de poucos” 

Ana Fábia cita o depoimento dramático de uma das pioneiras do cultivo associativo para pacientes que dependem do óleo com substâncias psicotrópicas e que gerou grande comoção aos participantes da Conferências pela Cannabis legal no Brasil , realizada em 20 de maio próximo. O evento reuniu lideranças de defesa social, empresários, pesquisadores e interessados em discutir propostas unificadas, para orientar o poder público a refletir e a ampliar regulamentações e legislações coerentes, que deem real acesso a planta e suas matérias-primas, por meio de percepções racionais, coesas e humanizadas aos brasileiros, sensibilizando ainda mais para a necessidade urgente de novas leis e regulamentos claros sobre o amplo acesso à Cannabis no país.

Cleusa Ladário, 64 anos, relatou os momentos dramáticos que está vivendo, sendo uma das muitas mães a ter o Habeas Corpus (HC) de auto cultivo medicinal revogado pela Justiça. A cannabis para uso terapêutico e medicinal é uma categoria medicamentosa, realidade em 100 países, atualmente. No Brasil, enfrenta preconceitos irracionais e resistências de legisladores negacionistas, apoiado por interesses econômicos de grandes indústrias farmacêuticas, conjectura.

“Tenho a plena convicção que o Estado matou meu filho, ao mandar a polícia invadir minha casa e levar as plantas que produzíamos o remédio do Samuel e ao prender meu marido ele adoeceu”. O jovem Samuca tinha 17 anos e era um conhecido autista severo não verbal, que quando criança foi desenganado por diversos médicos, ao não encontrarem medicamentos tradicionais, que evitassem seu estado degenerativo crônico.

Desde de 2020, dona Cleusa e o marido Ricardo ganharam na justiça uma nova chance ao Samuel, conquistando o direito de plantar e extrair o óleo da planta proibida no Brasil, desde 1938. Muitas evoluções científicas ocorreram em oito décadas com descobertas do Sistema Endocanabinoide e pelo elo exclusivo com os canabinoides encontrados na Cannabis sativa.

Na época da conquista do HC, a líder do associativismo canábico afirmou em entrevista cedida ao canal especializado Smoking Buddies: “Eram 60 convulsões por dia. Hoje é uma a cada mês. Eram crises terríveis de autismo, onde ele quebrava tudo. Hoje ele é uma criança super sociável. Cuida das plantinhas. Ele não segurava nada com as mãos, não andava, usava fraldas, comia por sonda. Agora, ele pinta quadros! O óleo de Cannabis transformou a vida do meu filho”. O menino autista zerou as convulsões, abandonou as fraldas e voltou a andar a ter uma vida próxima ao normal com o uso, específico, do óleo de Cannabis extraído em casa. Samuel faleceu quatro meses após o confisco do habeas corpus, devido a proibição de acesso às plantas que lhe deram, por alguns anos, qualidade de vida.

Negação da ciência canabinoide e “interesses escusos”

A Cannabis produz substâncias químicas conhecidas como canabinoides, faz parte de uma classe terapêutica e medicinal psicoativa há mais de 30 anos, e uma realidade em mais de 100 países, atualmente. Mesmo o Brasil sendo referência global sobre estudos do canabidiol (CBD), enfrenta resistências ideológicas de legisladores negacionistas que atacam o THC (Tetrahidrocanabinol), sendo desprezado, sem explicações lógicas, por parte de grandes indústrias farmacêuticas globais. 

Devido sua eficiência comprovada – e por reduzir o consumo massivo de medicamentos viciantes com opióides -, os canabinoides não geram dependências e podem colaborar no combate a mais de 500 tipos de doenças, patologias e problemas decorrentes de tratamentos convencionais da medicina moderna. Desde 2015, o Conselho Federal de Medicina e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária autorizam o

E, para piorar a situação desastrosa e de grande violência, os pais de Samuca (Cleuza e Ricardo Ladário) estão sendo processados pelo Ministério Público de Minas Gerais por tráfico de drogas. A mesma Justiça que havia lhes concedido o HC para o cultivo da Cannabis, agora oprime os pais do jovem autista severo falecido, de forma desproporcional e motivados por ignorar os conhecimentos científicos em torno da milenar planta ancestral.

“Há tempos estamos sofrendo ataques maliciosos e humilhações pelos agentes policiais, que deveriam nos proteger”, finalizou o depoimento/denúncia, durante um evento virtual. Uma violência que ela culpa o Estado brasileiro, motivado pelo despreparo em receber um brasileiro em condições críticas, nesta que deveria ser uma sociedade plural, tal como se apresenta ao mundo o Brasil.

“Esse é, apenas, um trágicos exemplos para ilustrar aos Poderes que precisam criar novos mecanismos legais para dar acesso seguro e humanizado a quem busca a vida em uma planta milenar, para reduzir misérias e impedir o sofrimento de nossa população”, comentou o relações governamentais e Vice-Presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis (ABICANN), Carol Aguiar, uma das organizadoras e mediadoras das conferências, que também, colabora com acesso de paciente à Cannabis Medicinal.

Significativo para discutir as consequências da descriminalização das drogas no Brasil, o evento do Ministério  da Justiça abordou questões cruciais relacionadas ao impacto dessa política sobre o sistema prisional e judiciário, além de explorar a relação entre políticas de drogas e o encarceramento em massa. O encontro reuniu especialistas, autoridades e representantes da sociedade civil para discutir essas questões e propor alternativas que possam resultar em uma política de drogas mais justa e eficaz, mitigando os problemas atuais de encarceramento excessivo e seletivo.

“A política de drogas e seu impacto no sistema prisional brasileiro é uma questão que não podemos mais ignorar. A descriminalização das drogas tem sido debatida amplamente, e hoje tivemos a chance de aprofundar nossa compreensão sobre suas possíveis consequências. Este evento nos proporciona um espaço para analisar como essa mudança pode influenciar o nosso sistema judiciário e, mais especificamente, o encarceramento em massa”, enfatizou o presidente da Comissão de Assuntos Prisionais da OAB/SC, Wiliam Shinzato.

“Se o bem jurídico tutelado pela Lei n. 11.343/2006 é a saúde, não me parece razoável tampouco proporcional às atuais políticas públicas sobre drogas, as quais encarceram de modo massivo os jovens, retroalimentam facções, esmagam direitos fundamentais, igualmente destroem famílias, além da letalidade policial, somado às possíveis corrupções por ausência de controle externo no poder de polícia (discricionário)”, destacou a vice-presidente da Comissão de Assuntos Prisionais, Bruna dos Anjos.

“A PEC 45/23 precisa ser discutida, pois criminalizar a posse de drogas ignora pacientes que usam cannabis medicinal, dificultando o acesso a tratamentos essenciais. Em vez de alterar cláusulas da Constituição, o legislativo deveria criar leis para pesquisa e uso medicinal de substâncias proibidas, conforme a Lei 11.343/06. Para reduzir o consumo abusivo e o poder dos narcotraficantes, devem ser adotadas políticas de educação e redução de danos, como foi feito com o tabaco, que teve seu consumo problemático reduzido sem criminalização”, comentou a presidente da Comissão de Políticas de Drogas, Raquel Helena Cardoso Schramm.

Fontes: OAB/SC e ABICANN