Por Fábio Costa | 18 de julho de 2022
Ajustar a RDC 327/19 à realidade das empresas brasileiras ajudará a aquecer o mercado, envolver mais empresas e ampliar o fornecimento de canabidiol (CBD) no Brasil?
A recente reunião da diretoria da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) definiu que é possível, agora, importar derivado vegetal de cannabis para obtenção de canabidiol isolado, ou seja, orientou o uso do fitofármaco CBD a partir de fornecimento de empresas de insumos nacionais. Antes somente era possível importar o canabidiol já obtido, como marcador prevalente em extratos ou como ativo isolado. O que não permitia a atividade desta área de extração e obtenção de ativos do Brasil no setor de cannabis. Agora teremos mais uma possiblidade atuando na cadeia produtiva.
Tal abertura nos chama atenção por valorizar a indústria nacional, gerar possibilidade de novos postos de trabalho, aumentar o portfólio de atividade das empresas que agora terão contato com o novo insumo e ativo. A grande pergunta é porque desde o início essa alternativa não era possível?
Sabe-se que existe um número pequeno de fábricas nacionais, com produtos de cannabis, autorizados pela RDC 327/19, dentro do universo possível. Esta permissão da Anvisa pode até impactar o preço final do produto, com um insumo de CBD mais competitivo. No entanto, não muda as demais exigências da RDC 327/19, quanto ao rigor de qualidade do produto final, nem as exigências com pesquisa clínica e os seus prazos previstos. Há, ainda, o planejamento com a abertura de mercado e conquista de market share. Isto é, o investimento necessário para um produto de cannabis é um dos grandes desafios de empresas e empreendedores para atuar com fitocanabinóides, em ambiente brasileiro.
Isto é, o investimento necessário para um produto de cannabis é um dos grandes desafios de empresas e empreendedores para atuar com fitocanabinóides em ambiente brasileiro. Outro fator, talvez limitante antes desta nova alternativa, é a dificuldade de identificar fornecedor de matéria prima com certificado de boas práticas de fabricação (CBPF) que a legislação da ANVISA solicita.
Se temos em torno de 500 indústrias farmacêuticas em nosso país com interesse em formular produtos de cannabis, mas falta insumo de CBD grau farmacêutico, temos uma barreira para ser vencida. Além do que a escassez dos fitoativos de cannabis provocar um alto preço destes, gerando valor comercial final pouco acessível à população e fora dos padrões de incorporação no SUS (Sistema único de Saúde).
Esta alternativa concedida pela ANVISA pode ser norteadora para abertura de campos de atividade além das indústrias de medicamentos humanos, pois com a maior disponibilidade do insumo para uso em território nacional, deve implicar na padronização de ativos que pode atender por exemplo ao setor de farmácia magistral que ainda precisa ser regulamentado, autorizado para manipulação de fitocanabinoides e licitação para se manipular no SUS, já que a Política Nacional de Fitoterápicos permite essa modalidade, o que ampliará a cadeia produtiva brasileira neste tema. O setores veterinário e de cosméticos também precisam ser considerados nesta revisão da normativa.
O custo deste insumo para ser extraído, isolado com um preço viável final do produto que será prescrito aos pacientes ainda é uma equação para ser resolvida. Ampliar a competitividade é uma fórmula que geralmente ajuda a desenvolver essa solução. Queremos acreditar que temos um horizonte positivo e aos poucos vamos percebendo a construção da sustentabilidade do segmento em nosso ecossistema.
Queremos acreditar que temos um horizonte positivo e aos poucos vamos percebendo a construção da sustentabilidade do segmento em nosso ecossistema. A premissa do cultivo nacional ainda é a perspectiva de acelerar o fomento de inovação, ampliar a gama de derivados da plantar e diversificar os consumos com as verticais da cadeia produtiva que a planta possibilita, por meio de pesquisa, desenvolvimento e empreendedorismo. Lembrando que ainda somos importadores de insumos com canabinoides, agora mais um item nesta modalidade, o fitoativo como derivado vegetal, é bom frisar.
Portanto essa decisão da agência sanitária brasileira demonstra que a revisão da RDC 327/19 pode suceder avanços regulatórios que permitam melhor desempenho para o setor de produtos de cannabis para fins terapêuticos no Brasil, tanto para ampliar os serviços de empresas viabilizando ativos e produtos, para um preço mais realista ao acesso dos pacientes e até atrair novos investimentos para o país, mas ainda distante da revisão estruturada que essa norma regulatória requer.
* Fábio Costa é farmacêutico, consultor em cannabis, atuante em T&D dos produtos de cannabis. É Coordenador do GT Farmacêutico da Associação Brasileira das Indústrias de Cannabis (ABICANN); e Cofundador do Grupo de Estudos Farmacêuticos em Cannabis e Psicodélicos (GEFCAP)
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(com informações do Green Science Times)